Legal Update: 15.ª alteração ao CCP – empreitadas de conceção-construção
Foi publicado o Decreto-Lei n.º 112/2025, de 23 de outubro, que veio proceder i) à décima quinta alteração ao Código dos Contratos Públicos (CCP), e à ii) terceira alteração à Lei n.º 30/2021, de 21 de maio (que aprova as medidas especiais de contratação pública).
As alterações em ambos os diplomas estão intimamente conexionadas, sendo relativas ao tema das designadas “empreitadas de conceção-construção”.
Com efeito, desde a redação original do CCP que o recurso à modalidade de “empreitadas de conceção-construção” se apresentava muito limitado, apenas sendo admissível nos estritos limites do n.º 3 do artigo 43.º de tal diploma codificador. Foi então preconizada, pois, uma clara separação entre a fase de conceção do projeto e a fase de execução da obra.
Essa solução originária do CCP (de limitar a empreitada conceção-construção a casos restritos) foi sustentada por boas razões, em especial, por ser ao contraente público que cabe em princípio definir até ao pormenor as características da construção que vai contratar – pois a obra a realizar será sua –, e isso só é possível se o projeto de execução for originário da parte pública, sendo apresentada em 2008 como uma das principais alterações em matéria de contratação pública, revelando-se constituir um profundo corte com o passado, do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de março, onde se admitia em termos generalizados as “empreitadas de conceção-construção”.
Volvidos 17 anos, o legislador reponderou as circunstâncias e entendeu “regressar ao passado”, passando a admitir, em termos gerais, as designadas “empreitadas de conceção-construção”.
É nesse contexto que se procede «à alteração do artigo 43.º do CCP, passando as entidades adjudicantes a poder recorrer à figura da conceção-construção não apenas em casos excecionais e devidamente fundamentados, mas sempre que, segundo juízos de discricionariedade e à luz dos interesses públicos em presença, concluam pela adequação daquela modalidade contratual», como se lê no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 112/2025. São, assim, alterados os n.os 1 e 3 do artigo 43.º do CCP, nos seguintes termos:
«Artigo 43.º
[…]
1 – Sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo anterior e no n.º 3 do presente artigo, o caderno de encargos do procedimento de formação de contratos de empreitada de obras públicas deve incluir um projeto de execução.
2 – […]
3 – A entidade adjudicante pode prever a elaboração do projeto de execução como aspeto da execução do contrato a celebrar, caso em que o caderno de encargos deve ser integrado apenas por um programa preliminar e o preço base nele definido deve discriminar separadamente os montantes máximos que a entidade adjudicante se dispõe a pagar pela execução das prestações correspondentes à conceção e à execução da obra.
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]
9 – […]
10 – […]
11 – […]»
A alteração ao n.º 1 teve o propósito de ressalvar o outro caso – para além do já previsto, relativo às “obras de manifesta simplicidade” – em que o caderno de encargos do procedimento de formação de contratos de empreitada de obras públicas deixa de ter a obrigação de incluir o projeto de execução: precisamente o caso das “empreitadas de conceção-construção”, a que o n.º 3 agora expressamente se refere com foros de generalidade, ou seja, sem a natureza excecional que até então assumia esta modalidade de empreitada.
Deste modo, pretendendo a entidade adjudicante que o adjudicatário assuma a elaboração do projeto de execução, o Caderno de Encargos deve ser integrado por um Programa Preliminar e o preço base deve discriminar os montantes máximos que a entidade adjudicante se dispõe a pagar pela execução das prestações correspondentes à conceção e à execução da obra (cfr. n.º 3).
A admissibilidade genérica das “empreitadas de conceção-construção” trazida pela 15.ª alteração ao CCP é, pois, uma alteração estrutural deste diploma codificador.
Por se tratar de uma alteração estrutural, a mesma implicou, coerentemente, a revogação do regime especial (para os contratos com financiamento europeu) e transitório de “empreitadas de conceção-construção” constante do artigo 2.º-A da Lei n.º 30/2021, de 21 de maio.
Adicionalmente, o diploma procede ainda à alteração do artigo 3.º da Lei n.º 31/2021, prevendo o aumento, a título excecional, dos limiares para a adoção dos procedimentos de consulta prévia e ajuste direto, no âmbito da celebração de contratos que se destinem à promoção de habitação pública ou de custos controlados, nos seguintes termos:
«Artigo 3.º
[…]
1 – Até 31 de dezembro de 2026, para a celebração de quaisquer contratos que se destinem à promoção de habitação pública ou de custos controlados, as entidades adjudicantes podem:
a) Adotar o procedimento de concurso público ou concurso limitado por prévia qualificação simplificados nos termos da presente lei, quando o valor do contrato for inferior aos limiares referidos nos n.os 2, 3 ou 4 do artigo 474.º do Código dos Contratos Públicos, consoante o caso;
b) Adotar o procedimento de consulta prévia simplificada, com convite a pelo menos cinco entidades, nos termos da presente lei, quando o valor do contrato for, simultaneamente, inferior aos limiares referidos nos n.os 2, 3 ou 4 do artigo 474.º do Código dos Contratos Públicos, consoante o caso, e inferior a € 1 000 000;
c) Adotar o procedimento de ajuste direto simplificado nos termos do artigo 128.º do Código dos Contratos Públicos, quando o valor do contrato for igual ou inferior a € 15 000.
2 – Até 31 de dezembro de 2026, no âmbito da celebração dos contratos que se destinem à promoção de habitação pública ou de custos controlados, as entidades adjudicantes podem ainda adotar o procedimento de ajuste direto, nos termos previstos nos artigos 112.º a 127.º do Código dos Contratos Públicos:
a) No caso da celebração de contratos de empreitada ou concessão de obras públicas, quando o valor do contrato for igual ou inferior a € 60 000;
b) No caso da celebração de contratos de locação, aquisição de bens móveis ou serviços, quando o valor do contrato for igual ou inferior a € 30 000;
c) No caso da celebração de outros contratos, quando o valor do contrato for igual ou inferior a € 65 000.
3 – Até 31 de dezembro de 2026, à celebração de contratos que se destinem à intervenção nos imóveis cuja titularidade e gestão tenha sido transferida para os municípios, no âmbito do processo de descentralização de competências é aplicável o disposto no artigo 2.º»
Uma nota final se justifica quanto à entrada em vigor das alterações promovidas pelo Decreto-Lei n.º 112/2025. O seu artigo 5.º prevê que «O presente decreto-lei é aplicável aos procedimentos de formação de contratos públicos iniciados após a sua data de entrada em vigor», mas é omisso quanto à «data de entrada em vigor». Tal omissão leva a considerar aplicável o período de vacatio legis supletivo previsto no n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro (lei que regula a publicação, identificação e formulário dos diplomas), na sua redação atual («Na falta de fixação do dia, os diplomas referidos no número anterior entram em vigor, em todo o território nacional e no estrangeiro, no 5.º dia após a publicação»). Quer isso dizer que as alterações promovidas pelo Decreto-Lei n.º 112/2025, entraram em vigor no dia 28 de outubro de 2025.
Face ao exposto, todos os procedimentos de empreitada de “conceção-construção” com decisão de contratar (por ser a decisão genética que marca o início do procedimento, cfr. artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 112/2025) posteriores a 27 de outubro de 2025 devem ter por fundamento a nova redação do n.º 3 do artigo 43.º do CCP – e já não o artigo 2.º-A da Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, que comportava exigências procedimentais diversas, e que, como vimos, foi revogado. Isso não significa, todavia, que os procedimentos simplificados da Lei n.º 30/2021 (concurso público simplificado, concurso limitado simplificado e consulta prévia simplificada) não possam assumir a modalidade de conceção-construção: por força da norma supletiva prevista no artigo 9.º da Lei n.º 30/2021 («…, sendo-lhes supletivamente aplicável a parte II do Código dos Contratos», e, por isso, também o n.º 3 do artigo 43.º do CCP, na sua nova redação, não afastado pela regulação especial constante da secção II da Lei n.º 30/2021), continua a ser possível recorrer à modalidade de conceção-construção de empreitadas naqueles procedimentos simplificados (ao abrigo do disposto no artigo 2.º) por aquela lei regulados, nos termos da nova redação do n.º 3 do artigo 43.º do CCP (ex vi daquele artigo 9.º da Lei 30/2021).