O Teletrabalho no atual Estado de Emergência

O Decreto n.º 3-A/2021, de 14 de janeiro – sucessivamente alterado pelos Decretos nºs 3-B/2021, 3-C/2021 e 3-D/2021 –, que regulamenta, atualmente, em todo o território continental, o Estado de Emergência decretado pelo Presidente da República, estabelece, no respetivo artigo 4.º, n.º 1, um dever geral de recolhimento domiciliário, prescrevendo expressamente que os cidadãos não podem circular em espaços e vias públicas, bem como em espaços e vias privadas equiparadas a vias públicas, devendo permanecer no respetivo domicílio, exceto para deslocações autorizadas pelo referido Decreto.

Ora, nos termos do artigo 4.º, n.º 2, als. c) e x), daquele diploma legal, consideram-se deslocações autorizadas, entre outras, aquelas que visam o desempenho de atividades profissionais ou equiparadas, assim como para efeitos de retorno ao domicílio, quando não haja lugar ao teletrabalho nos termos do mesmo Decreto, ou seja, quando o teletrabalho não seja compatível (total ou parcialmente) com a atividade desempenhada ou quando o trabalhador não disponha de condições para exercer essa atividade em regime de teletrabalho, conforme estabelece o artigo 5.º, n.º 1, do referido Decreto n.º 3-A/2021, de 14 de janeiro.

Este artigo 5.º do Decreto, n.º 3-A/2021, de 14 de janeiro, referente ao teletrabalho, estabelece um regime em muitos aspetos semelhante ao vertido nos artigos 5.º-A e 5.º-B do Decreto-Lei n.º 79-A/2020, de 1 outubro, ainda que estes últimos se encontrem transitoriamente derrogados, durante o atual período de estado de emergência, por força do disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 6-A/2021, de 14 de janeiro (que altera o regime contraordenacional no âmbito da situação de calamidade, contingência e alerta e agrava a contraordenação relativa ao teletrabalho obrigatório durante o estado de emergência).

Atente-se que do atual regime deixaram de constar alguns aspetos que o Decreto-Lei n.º 79-A/2020, de 1 outubro, pormenorizava, como sejam, por exemplo, i) a exigência expressa de que o empregador comunicasse ao trabalhador, fundamentadamente e por escrito, a impossibilidade de prestação de atividade em regime de teletrabalho por incompatibilidade das funções em causa com esse regime ou por falta de condições técnicas adequadas para a sua implementação, ii) a possibilidade de o trabalhador, nos três dias úteis posteriores à comunicação do empregador, solicitar a intervenção da ACT, ou ainda iii) o dever de o trabalhador informar empregador, por escrito, dos motivos do seu impedimento nos casos em que não dispusesse de condições para exercer as funções em regime de teletrabalho.

Não obstante, apesar de estes aspetos não constarem expressamente do atual Decreto n.º 3-A/2021, de 14 de janeiro, não pode verdadeiramente considerar-se que o seu campo de aplicabilidade tenha sido completamente suprimido, por aplicação das regras e dos princípios gerais decorrentes, designadamente, do dever de boa-fé, e, nesse sentido, poderá concluir-se que, na prática, o atual regime não é inovatório.

Atento este enquadramento, ainda que cada situação concreta deva sempre merecer uma análise individual, a priori não se afigurará indispensável alterar, face ao Decreto n.º 3-A/2021, de 14 de janeiro, as situações de teletrabalho já vigentes.

Ainda assim, atento o dever de informação do empregador, poderá será conveniente atualizar quaisquer anteriores comunicações de serviço gerais referentes ao teletrabalho, na eventualidade de o empregador as ter vindo a emitir como tem ocorrido em muitas empresas, e será efetivamente necessário adaptar, em especial, as comunicações referentes a novas situações a constituir, nomeadamente nos casos de necessidade pontual de prestação de atividade em regime de trabalho presencial – mesmo porque as anteriores comunicações, apesar de, em certos casos, terem sido redigidas para se aplicarem, teoricamente, enquanto perdurasse uma obrigação de teletrabalho decorrente de situação de estado de emergência, poderão mencionar expressamente o artigo 5.º-A do Decreto-Lei n.º 79-A/2020, de 1 outubro, que, como já mencionado, se encontra agora transitoriamente derrogado.

Por outro lado, ainda que o atual Decreto n.º 3-A/2021, de 14 de janeiro, não mencione que a circulação para desempenho de atividades profissionais deva ser atestada através de declaração do empregador (como sucedia com o artigo 11.º, n.º 2, al. a), subal. i), do Decreto n.º 9/2020, de 21 de novembro), nada obstará a que uma declaração desse género seja emitida, quer nos casos em que a impossibilidade de prestação de atividade em regime de teletrabalho é meramente esporádica, quer nas situações em que a necessidade de deslocações seja mais frequente ou até permanente.

Miguel Ribeiro dos SantosDepartamento Laboral da BAS

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